Em Defesa de Jacob (Defending Jacob) é uma minissérie de drama criminal do novo streaming Apple TV+, com 8 episódios de aproximadamente 50 minutos e um elenco estelar. Temos o nosso eterno Steve Rogers, Chris Evans, como Andy (o Pai), Michelle Duckery, conhecida como Mary Crawley, interpretando Laurie (mãe) e o Jaeden Martell, que todos lembram do filme It, como o pobre Jacob que passa a série toda sendo defendido.

A série se trata de uma adaptação baseada no romance homônimo de William Landay, e possui aquela ambientação clássica, fria, em uma cidadezinha com uma vizinhança da classe média alta americana. Os planos para compor a narrativa da série foram escolhidos para dar ênfase na bela atuação deste power trio. A interpretação foi impecável. Conseguimos sentir a agonia de cada personagem. A determinação de Andy, a melancolia de Laurie e a frieza de Jacob.
A cada episódio, vemos peças do quebra-cabeças formarem um arco dramático com potencial incrível. São reveladas fragilidades quase nunca expostas de uma família que aparentemente é feliz e se enquadra perfeitamente no padrãozinho americano. Se a série fosse brasileira, certamente esta família seria classificada como “cidadãos de bem”. Porém, vemos um pai que é totalmente negacionista. O filho está em primeiro lugar e ele não aceita nada de negativo relacionado ao comportamento dele. Uma crítica muito sutil à como os pais de hoje em dia defendem seus filhos a todo custo, acreditando sempre em suas palavras e realizando seus desejos constantemente, em contraponto com o enorme abismo da dupla personalidade dos adolescentes, a on-line e a presencial. Os pais acreditam no que dizem, mas não os conhecem de verdade e não conseguem ver do que são capazes.
No início, Jacob parece um adolescente normal, mas sua frieza e falta de clareza em sua comunicação nos deixa com uma pulga atrás da orelha. Uma digital é encontrada no casaco da vítima de assassinato, Ben, que é seu colega de classe e que fazia bullying com ele. A defesa que Jacob apresenta é que ele apenas encontrou o corpo e colocou suas mãos para atestar se estava tudo bem com seu amigo. Porém, não pediu ajuda e não contou a ninguém. Chegou no colégio sorrindo e fazendo piada, como se nada tivesse acontecido. Acusações são feitas na internet, contando que Jacob carregava uma faca, e Ben havia sido assassinado com uma faca. Seria coincidência? Neste momento, conseguimos vestir os sapatos de Andy ou de Laurie. Andy acredita em Jacob e não se permite questionar a inocência do filho. Já Laurie, possui uma parte de si que questiona não só a inocência, mas sua responsabilidade na formação de caráter e criação do filho. Aí nos perguntamos, “o que eu faria?”, “Qual dos dois eu seria?” …
A série também possui linhas temporais. A atual, onde se passa o assassinato, e futura, onde o interrogado é Andy. Então sabemos que alguma coisa depois do julgamento aconteceu, o que nos prende ainda mais à trama. Como os episódios foram lançados semanalmente, foi uma excelente estratégia de ganhar a audiência e gerar teorias e especulações. O mesmo se dá à The Morning Show, que também possui estes ganchos maravilhosos.

Não posso deixar passar em branco a participação do ator J. K. Simmons, como o pai de Andy, avô de Jacob, que dispensa apresentações. O personagem traz uma reviravolta incrível, que põe em debate uma discussão antiga. Uma análise genética de quase 900 criminosos na Finlândia revelou dois genes que podem ser associados à violência. É claro que nem tudo é tão simples como parece. Não se sabe se isto, isoladamente, torna um indivíduo violento, pois existem diversos fatores que, dentro de estudos da psicologia, contribuem para o desenvolvimento violento de uma pessoa, como o ambiente.

A personagem adolescente Sarah (Jordan Alexa Davis), amiga de Jacob, foi totalmente desperdiçada. A série possui cenas onde ela toca violão e produz vídeos em casa, que não serviram para absolutamente nada. Ficamos na expectativa dela realmente ter um tempo de tela útil, mas isto não acontece. A relevância que ela traz para a trama poderia ser muito maior e melhor desenvolvida.
Zona de Spoilers Fortes
A série tem um ritmo que evolui de episódio para episódio, porém, quando chegamos ao último, o ritmo cai drasticamente. Finalmente é revelado o futuro, onde Andy está sendo interrogado.
No penúltimo episódio, temos quase certeza de que Jacob é o assassino. Isto porque ele escreveu um conto bem detalhado e forte sobre um assassinato com facas entre dois garotos, que possui muita similaridade com o caso. O conto foi escrito três dias depois do assassinato. Perdemos todas as esperanças, até que outro suspeito, que era um pedófilo, Leonard Patz (Daniel Henshall), se suicida e assume a culpa do assassinato de Ben e assim, inocentando Jacob.

A reviravolta do último episódio mostra Andy descobrindo facilmente que seu pai, preso há muitos anos por estupro e assassinato, que encomendou o suicídio de Patz. E voltamos à estaca zero. Algumas pistas ficam soltas neste momento, como uma das testemunhas a favor de Jacob, que diz que Leonard Patz havia mencionado Ben algumas vezes, e desaparece do nada. A dúvida volta aos nossos corações e não é revelado se Jacob é ou não inocente. Andy, como um clássico cidadão de bem, decide não comunicar que na verdade Leonard Patz não escreveu a carta de livre e espontânea vontade.
O pesadelo termina e a família vai viajar para o México, até que outro incidente acontece. Uma garota chamada Hope, na qual Jacob fez amizade, desapareceu. Não foi culpa do Jacob dessa vez, a garota reaparece, mas Andy acaba revelando, sob pressão, para Laurie, que Patz foi “suicidado” pelo seu pai. Isto gera muitos gatilhos em Laurie e ela acaba… respire… enlouquecendo.
Um dia ela decide levar Jacob para cortar o cabelo e acaba provocando um acidente de carro para se suicidar e matar seu filho, pois ela acredita que ele realmente tenha sido o assassino, e não consegue mais lidar com mentiras. Ambos sobrevivem e descobrimos que Andy do futuro estava sendo interrogado para defender Laurie de uma acusação de homicídio. Andy passa um pano, já que tem prática, e consegue safar sua esposa. Laurie está consciente, mas não lembra do ocorrido e nem do seu surto psicótico, e Jacob está em coma.
Fim. Péra… A série não fala se Jacob é realmente o assassino. Eles decidem deixar no ar. E isto é realmente muito frustrante. Eu fui atrás de saber sobre o livro e recebi a informação de que Jacob era o culpado. Hope, a menina desaparecida da viagem morre, e Laurie acha uma camiseta de Jacob manchada de sangue. Aí te pergunto. Por quê? Na série não temos nada que nos garanta que Jacob possa ser o assassino e a mãe dele ainda encarna o papel clássico e antiquado de mulher louca. Posso dizer que, nem li o livro, mas já sei que o final é melhor que o da série. Muito mais coerente. Uma pena não terem culpado Jacob do assassinato. Nem que fosse com alguma pista… Nem que fosse com a camiseta manchada de sangue.
Ao todo, a série é boa e vale a pena ser assistida. Algumas pessoas podem não se importar com o final em aberto. A qualidade da produção é tão boa que faz o final ficar menos pior. Selo Game Of Thrones de qualidade. Na dúvida, coloque uma mulher louca que queima tudo e pronto.
Sabemos que o real propósito de um final em aberto é nos fazer pensar em outras questões, que não… a principal. Neste caso, o propósito fica em questionarmos se o fato de Jacob ter propensão à psicopatia realmente o torna um assassino. O mesmo caso se aplica à Patz. E também sobre as questões familiares que já falamos no início desta crítica. Porém, a série falhou ao criar a expectativa sobre a culpa do assassinato e não a entregar, já que isto apenas era uma isca.
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